quinta-feira, 8 de abril de 2010

Pronunciamento do deputado Marcelo Freixo em Plenário dia 07 de abril, na ALERJ.

Texto do Discurso
O SR. MARCELO FREIXO – Sr. Presidente, demais Deputados, antes de qualquer coisa, manifesto a minha solidariedade a todas as famílias de Niterói, Rio de Janeiro e São Gonçalo que foram vitimadas por essa tragédia provocada pela chuva e pela ausência do poder público. É lamentável, é trágico.

Hoje recebi um convite, Sr. Presidente, para visitar algumas dessas comunidades. Falei que não era hora de um Deputado aparecer em um lugar como esse. É hora, evidentemente, de o poder público aparecer. Nós sabemos quais são as necessidades, fazemos as visitas na hora certa, diante da necessidade de quem está lá, e não diante da necessidade do Parlamento. É muito grave o que aconteceu e quero aqui narrar algumas coisas que me preocupam bastante, principalmente no que diz respeito à postura dos nossos governantes.

Na segunda-feira, eu estava nesta Casa trabalhando. Saí daqui por volta de 17h, 17h30, para me dirigir à Câmara de Vereadores. Lá participei de um evento, de uma homenagem à cantora Fernanda Abreu, que é muito amiga, e quando eu saía daqui da Assembleia começava a chover, era o início da chuva. Quando cheguei à Câmara de Vereadores, já havia um caos estabelecido na cidade. Vários convidados, inclusive a própria Fernanda, só conseguiu chegar uma hora e meia depois.

Então, é bom dizer que é verdade que foi um grande volume de água, que a chuva foi intensa, choveu em 12 horas o equivalente a mais de um mês. Isso é verdade! Mas é verdade também que, com poucas horas de chuva, a cidade já estava inviável, já estava completamente paralisada, muito antes de todo esse volume de água que se anunciou e que se percebeu no final. Então, não é desculpa dizer que o volume de água ocasionou tudo isso.

O prefeito perde um pouco a razão quando nós observamos o que aconteceu com a cidade. E mais do que isso. Cadê o plano de emergência, Deputado Luiz Paulo, que tanto foi anunciado, que tanto se fez propaganda? Aliás, é o Governo municipal somando forças com o Governo estadual, somando forças com o Governo federal. Nunca vi um somatório tão grande dar em nada, absolutamente em nada; é mais, mais, mais para dar em menos.

Ora, não havia policiais, não havia guarda municipal, não havia orientação. A cidade ficou absolutamente um caos e abandonada durante toda a noite. Não há plano de emergência! Não adianta dizer: “Fiquem tranquilos. O plano de emergência vai funcionar na hora certa”. Como na hora certa? Qual é a hora certa? Mais de 100 pessoas morreram! Não era essa a hora de o plano de emergência funcionar? Qual é o momento onde isso vai funcionar?

Então, não é verdade, mais uma vez, não é aceitável, mais uma vez, que se coloque a responsabilidade da tragédia nos fenômenos da natureza. A responsabilidade é humana e é política.

Neste sentido, se nós falarmos: “Olha, o Rio de Janeiro não se preparou para a neve que caiu no mês de abril”. Claro! No Rio de Janeiro não cai neve, não pode estar preparado para isso. Agora, dizer que o Rio de Janeiro não se preparou para a chuva?! Ora, é claro que vai chover com intensidade no Rio de Janeiro, o Brasil é um país tropical, o Rio de Janeiro tem sempre grandes chuvas. Como não estar preparado para a chuva?! Vai estar preparado para o quê? Para o terremoto? Para a neve? Tem que estar preparado é para a chuva, e que não está nunca. E aí não é um ou outro governo, são os dez governos sucessivos que não têm responsabilidade. Mas por uma razão: é verdade que atingiu a cidade inteira, mas é verdade que, de forma fatal, atingiu fundamentalmente os pobres, os mesmos que são vítimas da lógica da ordem, e que agora são vítimas da desordem implementada pela ausência do Poder público.

Neste sentido, Deputado Paulo Ramos, é inadmissível, é inadmissível que o Governador do Estado do Rio de Janeiro tenha colocado a responsabilidade das mortes nos mortos. Isso é de uma covardia! O Governador do Estado do Rio de Janeiro é um covarde, é um irresponsável. Jamais poderia ter dito que a responsabilidade da morte dessas pessoas foi de quem morava em área de risco, como se as pessoas pudessem escolher se vão morar em uma área de risco ou se vão morar em uma área segura. Desde quando as pessoas têm essa possibilidade? Desde quando as pessoas moram em uma área de risco porque querem morar em uma área de risco? Qual é a política habitacional? Qual é o direito à moradia garantido, seja do Governo federal, do Governo estadual, do Governo municipal. Não há políticas de moradia! Não há política habitacional! E vem o Governador, de forma irresponsável, dizer que a responsabilidade da morte é de quem morava em uma área pobre. Ele que não desenvolve um programa decente de moradia, ele e seu parceiro municipal - prefeito mimado, que não pode ser criticado - não desenvolvem um programa de moradia. Como dizer que a responsabilidade é de quem morreu? Que covardia! É inadmissível! Estou aqui repudiando! Esse, sim, é o verdadeiro oportunismo!

E quero dizer que fazer crítica ao Poder público nessa hora não é oportunismo de plantão não, é na verdade, independência, porque quem vem aqui dizer que o prefeito não tem responsabilidade, que o Governador não tem responsabilidade, é porque tem medo, é porque tem o que perder nas negociatas políticas. Não é oportunismo, não; é independência. Oportunismo é se aproveitar e ter que apoiar prefeito e governador numa hora como esta, tão trágica. Isso é que é oportunismo! Isso é que é oportunismo de plantão: é fazer com que os cargos que são distribuídos para comprar deputados valham mais do que a vida de quem morreu. Isso é que é oportunismo! E não vir aqui fazer a crítica correta, como tem que ser feita. Porque não tenho dependência alguma com qualquer um desses governos.

É estranho que o governo federal venha dizer que o problema é dos governos passados, como se este não fosse continuidade do anterior no Rio de Janeiro. Mais do que isso, o Ministro da Integração Nacional, Gedel Vieira (PMDB), não me parece ser uma pessoa tão preocupada com a integração nacional, porque 45% dos recursos desse ministério num momento importante como este foram destinados à Bahia, sua terra natal, numa desproporção absurda. Foram mais recursos para essas cidades que não são sistematicamente vitimadas por esse tipo de fenômeno do que para outras cidades que são sistematicamente vitimadas por esses fenômenos. Então, o governo Lula tem também sua dose de responsabilidade nessa distribuição de cargos que têm esse efeito político.

Visitei, há dois meses, junto com alguns jornalistas de O Globo Niterói, o Morro do Estado. Deputado Altineu Côrtes conhece Niterói. Fui visitar o Morro do Estado por outra questão, pelo GPAE, o grupamento de policiamento ali estabelecido. Havia muitas reclamações, o GPAE abandonado enquanto as UPPs são valorizadas. Fui visitar o Morro do Estado para conversar com os policiais e com os moradores.

Os moradores me levaram a uma área chamada Barreira. Estavam muito preocupados porque era uma área em que já havia ocorrido um deslizamento, as casas estavam em situação muito perigosa ali, e queriam chamar atenção para isso.

Quando eu e o repórter vimos a situação, imediatamente ligamos para a Defesa Civil da Prefeitura de Niterói. O que ouvimos foi: “Vamos tomar providências”. No dia seguinte, liguei novamente. Liguei durante toda a semana e nenhuma providência foi tomada. A área que desmoronou no Morro do Estado, que vitimou diversos moradores, foi exatamente essa área da Barreira, onde a Defesa Civil de Niterói, depois de alertada, nada fez.

Então, vem o prefeito da cidade de Niterói, que é sócio da especulação imobiliária daquela cidade, que gasta o seu tempo em reuniões longas com os especuladores e não com os moradores da cidade, é uma cidade vendida ao interesse especulativo e financeiro, dizer que agora é a hora de se preocupar com as vidas?

Agora é hora de toda a população de Niterói estar unida se preocupando com as vidas, mas a responsabilidade do prefeito é diferenciada: ele tem que assumir responsabilidade, pedir desculpas, e saber que eles foram alertados de que aquela tragédia poderia acontecer e que poderia ter sido evitada. Isso tem que ser dito.

Por fim - o meu tempo esgotou, Deputado Paulo Ramos - estou aqui reproduzindo o texto de uma carta de leitor de O Globo de hoje: “O Governador Sérgio Cabral finalmente cumpriu uma promessa de campanha: levou água e esgoto a todo o Rio de Janeiro”.

Muito obrigado, Sr. Presidente.